SANTOS
DA NOSSA HISTÓRIA
SANTOS
DA NOSSA VIDA
Falando
sobre a santidade na vidas das pessoas, Bento XVI escreveu o seguinte: “em
todas as épocas da história da Igreja, em qualquer canto na geografia do mundo,
os santos pertencem a todas as idades e a qualquer estado de vida, são rostos
concretos de todos os povos, línguas e nações. [...] Acrescento que, para mim,
não só alguns grandes santos, que amo e que conheço bem, servem como ‘placas de
sinalização’, mas principalmente os santos simples, ou seja, as pessoas boas
que vejo na minha vida e que nunca serão canonizadas. São pessoas normais, por
assim dizer, sem heroísmo visível, mas em quem, na sua bondade de todos os
dias, vejo a verdade da fé. Essa bondade, que amadureceram na fé da Igreja, é
para mim, a mais garantida apologia do cristianismo, e o sinal de onde está a
verdade”.
Mesmo
sem possuir a clarividência do Papa Emérito nem a profundidade de suas intuições,
em proporções menores, eu também posso reconhecer a veracidade de suas palavras
em pessoas que passaram por minha vida ou ainda estão, aqui, comigo, na transitoriedade
do tempo que nos encaminha para a eternidade. João Paulo II, com quem estive três
vezes; Madre Tereza de Calcutá e Irmã Dulce, para citar alguns exemplos perto
de nós, e que já celebraram a sua Páscoa definitiva, são testemunhos de uma
vida santa. Mas há também aqueles santos que, na afirmação de Jacques Maritain,
“nunca serão canonizados”.
É,
pois, dentro do contexto desse pensamento que eu gostaria de recordar e fazer
memória da Irmã Maria Alice Portela (1928-1999), que nasceu e Portugal, viveu
muitos anos em Paris, como superiora geral de sua congregação – a Congregação
da Irmãs Franciscanas Missionárias de Nossa Senhor – mas também dedicou tempo
de sua existência em Itabaiana, Rio das Pedras e em Jequié, na Bahia. Sei que
com essa publicação muitos amigos se lembrarão dela. No mundo globalizado e
moderno, ela era de um espírito cativante e empreendedor no âmbito das vocações
que devia cultivar para o bem da Igreja e dos consagrados. Era um testemunho de
serviço e de alegria em meio a todos com quem convivia. Não por acaso, o livro que
escrevemos sobre ela – uma obra a várias mãos, se intitula, numa singela
homenagem “...passou sorrindo...”. Foi publicando em português e francês. Há um
dramático relato meu, justamente, fazendo referência ao dia 14 de mais de 1999,
dia em que fui me despedir dela, sempre sorridente, porque ela deveria partir
para sua terra natal, a fim de levar adiante o tratamento de saúde. Também porque
afirmou ter medo de morrer fora de sua pátria. Naquele dia, depois da
despedida, no Rio das Pedras, viajando para Salvador, eu capotei o carro, num
acidente. Fui obrigado a retornar, ferido, para o Hospital, de modo que, na
segunda-feira seguinte, pude ir ao aeroporto para aquele instante de “adeus”.
Vinte
anos se passaram, e eu conservo ainda o frescor de sua personalidade, sofrendo
no corpo e no espírito, mas sorridente também. Em agosto daquele ano, eu fora
hospedado na casa de sua congregação em Paris, vindo da Itália, onde participei
de um curso de formação religiosa. No dia 24 do mesmo mês, dia em que deixei a “cidade
Luz”, falei com ela por telefone. Aliás, chorei mais do que falei. Ela, muito
doente, simplesmente, me disse: “Padre, quando chegar ao Brasil, mande
notícias, mas não espere mais notícias minhas...”. Depois de tantos encontros
que tivemos ao longo de mais de dez anos, aquele foi nosso último diálogo, e
ela faleceu no Porto, no dia 2 de novembro de 1999. Nunca a esqueci e sempre
trago comigo em minhas orações. Tenho certeza de que ela também vive na memória
de muitos amigos e admiradores. Penso que seu pensamento traduz o sentido
profundo também de sua vida, de seu testemunho e de sua existência no meio de
nós: “Que através de nosso testemunho de vida fraterna vivida no Amor e na Fé
profunda, possamos dar muito amor a todos aqueles que nos rodeiam e que têm
necessidade de nós. Que possamos levar Esperança àqueles que a vida faz sofrer
e para quem ela não tem sentido; muita alegria àqueles que a tristeza e o
sofrimento impedem de viver”. De fato, onde a Ir. Maria Alice chegava levava
consigo luz e esperança aos circundantes.
Que
a contemplação da luz divina no céu seja sua mais digna recompensa por tanta
bondade semeada no nosso caminho, na estradas de todos que tiveram o privilégio
de encontrá-la pelas estradas da vida. Descanse na paz do Senhor, Irmã Maria
Alice Portela.