Dom Henrique Soares da Costa
Assim é a história da Igreja de Cristo
Assim é a história da Igreja de Cristo
Uma
das maiores riquezas do dom vocacional dos que respondem ao convite de Cristo,
é a não pertença a si mesmo. Grande dom, grande mistério. A vida oferecida por
Deus ao homem pode ser a Ele mesmo devolvida em atitude de gratuidade. É, mais
ou menos, isso o que acontece com os ministros consagrados da Igreja de Cristo.
Desse modo, o dom da liberdade com que assumimos o convite do Senhor é a força
que nos faz ir, aqui e ali, segundo a vontade do próprio Senhor. Assim é a
História da Igreja, que não nos pertence como nós também não nos pertencemos.
Dentro dessa zona de mistério, de doação e de generosidade, eis que Dom
Henrique Soares da Costa, que durante quase cinco anos foi Bispo Auxiliar de
Aracaju, agora é transferido pelo Santo Padre, o Papa Francisco, para a Diocese
de Palmares, no interior do Estado de Pernambuco.
Nunca
tinha ouvido falar de Henrique Soares da Costa até o dia em que, passando
alguns dias de férias em Roma, entre março e abril de 2009, soube que ele fora
nomeado Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Aracaju. Busquei na internet alguns
dados sobre sua pessoa, e, então, cresceu dentro de mim o desejo de conhecê-lo
pessoalmente, o que aconteceu no dia de sua apresentação na Arquidiocese de
Aracaju, no dia 3 de julho de 2009. Pequeno, de estatura mediana, corpo
franzino, encontrei no toque de sua cordialidade a expressão humana de um homem
gigante pela perspicácia e sabedoria derramadas na elasticidade de seus
discursos, na coerência de seus gestos, na firmeza intrépida de seu pensamento,
enfim, na defesa intransigente da fé da Igreja Católica. Um presente de Deus
para a Arquidiocese de Aracaju. Um grande auxílio a Dom Lessa, diante das
exigências pastorais que também ficavam ao alcance de sua responsabilidade. Mas
o tempo urge, é implacável. Quase cinco anos depois, ele é chamado a ir para
horizontes mais distantes, num Regional da CNBB (Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil), que lhe é muito conhecido e querido. Vai, como disse Jesus a
Pedro, lançar a rede de seu ministério episcopal em águas mais profundas (Lc
5,1-11). Agora, na consciência de uma responsabilidade mais grave, mais aguda,
ancorada nas convicções do labor pastoral que o múnus de pastor lhe exige
diante das ovelhas do rebanho que lhe é confiado. É o “sim” dito a Cristo que
se renova na dimensão interior do chamado divino, pois, o mesmo “sim” dado a
Cristo uma vez deve ser repetido, com desprendimento e generosidade, tantas
vezes quanto ele o desejar.
Segundo
o Concílio Vaticano II, “o Bispo deve ser considerado como o sumo sacerdote de
seu rebanho, em quem tem origem e de quem depende, de algum modo, a vida dos
fiéis em Cristo” (Sacrosanctum Concilium,
n. 41). Daí a belíssima expressão escolhida por Dom Henrique Soares para
expressar a orientação pastoral de sua vivência espiritual resumida pelo seu
lema episcopal: “In Christo Pascere!”
– “Apascentar em Cristo”. De fato, é em nome de Cristo e de sua Igreja que o
Bispo age em favor de seu rebanho. Desse modo, o tríplice múnus de seu
ministério, no sentido de “ensinar, santificar e governar”, reveste-se da mesma
autoridade de Cristo. Essa é, conforme o mesmo Concílio Vaticano II, a
“sacralidade do episcopado”, pois, “na pessoa dos bispos, coadjuvados pelos
presbíteros, é o próprio Senhor Jesus Cristo, pontífice supremo que está presente
no meio dos fiéis. Embora sentado à direita de Deus Pai, não se ausenta da
comunidade dos seus pontífices; mas é principalmente do ministério excelso dos
bispos que Jesus Cristo prega a Palavra de Deus a todos os povos e administra
continuamente os sacramentos da fé aos crentes; e, graças ao serviço paternal
dos mesmos (cf. 1Cor 4,15), vai incorporando por geração sobrenatural [itálico meu] novos membros ao seu corpo;
finalmente, pela sabedoria e prudência dos bispos, dirige e orienta o povo do
Novo Testamento na sua peregrinação para a eterna bem-aventurança. Estes
pastores, escolhidos para apascentar a grei do Senhor, são os ministros de
Cristo e os administradores dos mistérios de Deus (1Cor 4,1), e a eles está
confiado o testemunho do Evangelho da graça de Deus (cf. Rm 15,16; At 20,24) e
o serviço glorioso do Espírito e da justiça (cf. 2Cor 3,8-9)” (Lumen Gentium, n. 21). Agora, como ele
mesmo afirmou em entrevista concedida aos sistemas televisivos de comunicação
do Estado de Sergipe, ele estará em casa, mais livre e mais à vontade para
dirigir e guiar o seu povo no caminho de Deus, com toda a força espiritual de
sua própria autoridade episcopal, mas também ajudado pelo seu presbitério – os
padres de sua Igreja Particular, no caso, a Diocese de Palmares, cuja sede
estava vacante com a renúncia de Dom Genival Saraiva de França, que, em abril
de 2013, completara 75 anos de vida, tempo em que o bispo diocesano é
“solicitado a apresentar a renúncia do ofício ao Sumo Pontífice, que,
ponderando todas as circunstâncias, tomará providências”, mediante as
orientações do Código de Direito Canônico (Cân. 401).
Quanto
à notícia em ser o novo Bispo da Diocese de Palmares, Dom Henrique declarou: “A
gente recebe uma ligação de Roma, perguntando se aceita ou não a nomeação. Eu
aceitei, a resposta voltou a Roma, o papa confirmou a nomeação e perguntou
quando eu queria que fosse tornada pública a nomeação. Como Dom Lessa estava
viajando, esperei ele voltar para contar. A tradição é que o anúncio seja dado
às quartas-feiras, e coincidiu com o Dia de São José”. Sobre a sua Diocese, ele
o afirmou: “Foi uma Diocese muito castigada em 2010 pela cheia, onde a cidade
foi praticamente destruída. É uma Diocese onde parte dela fica no litoral,
outra parte no agreste e a outra na Zona da Mata. Estou muito feliz porque o
bispo auxiliar é plenamente bispo, mas, no exercício de seu ministério, o bispo
diocesano tem o seu clero, seus seminaristas e agora vai colocar para fora toda
a sua paternidade que recebeu de Deus”. Marcando a História da Igreja em
Sergipe com sua presença, por quase cinco anos, sua gratidão entendeu-se a
todos os sergipanos: “Sempre me relacionei bem com a sociedade em geral, com os
políticos, com os empresários, com o clero, com as congregações religiosas, com
os movimentos. Então, foi uma experiência muito bonita. Agradeço a convivência
que tive com Dom José Palmeira Lessa, mas chegou o tempo de ter a minha casa.
Aqui sou irmão do dono da casa, lá eu vou ser o pai da família e vou ter a
minha casa. Agradeço ao Santo Padre por me confiar nessa tarefa”. Por fim, ele
acrescentou: “A mim custa deixar Sergipe e os sergipanos que me acolheram tão
bem. Eu fico pensando, por exemplo, dos momentos que tive aqui, a Hora Católica é um deles, onde eu,
andando em Sergipe, ouvia falar de não perderem. Agradeço a fé do povo
sergipano, a fé que eu partilhei e ajudei a criar. Agradeço a experiência de
Igreja aqui, e saiba que aonde eu for Sergipe fará parte de minha história”.
Misteriosa Igreja de Jesus Cristo! Existe outra igual a ela, em dinamismo
missionário e disponibilidade de pessoal para acatar os anseios do povo de Deus
que recebe seus pastores como ao próprio Cristo? Outro dia eu recebi uma
mensagem que indicava a presença avassaladora da Igreja Católica em [quase]
todas as cidades do mundo, inclusive, nos povoados aos quais os padres dão
assistência pastoral como extensão da pessoa do bispo, de quem eles são os mais
imediatos colaboradores.
Que
Deus abençoe a Dom Henrique Soares da Costa nessa nova etapa de sua vida, a fim
de que seu ministério episcopal seja cada vez mais fecundo e profícuo à frente
da porção do rebanho do Senhor que ora lhe é confiado. De sua pessoa,
guardaremos o frescor de seu testemunho e a grandeza de sua humanidade,
desejando que Deus o conserve, assim, fiel filho da Igreja de Jesus Cristo e
incansável Apóstolo, operário de sua vinha.
Dom Henrique faleceu no dia 18 de julho de 2020, vítima da pandemia do Covid-19 que perturbou o mundo numa tragédia humanitária sem precedentes nos tempos modernos.