sábado, 24 de dezembro de 2022

 

Uma manjedoura cheia de graça



 

Uma manjedoura cheia de graça! Também não poderia ser diferente. O cocho no qual é colocado o feno e o capim para alimentar os animais, tornou-se o lugar do pequeno menino nascido em Belém – em hebraico “Betlehem” que significa “casa do pão” – não para ser capim, mas alimento vivo que sacia a fome de eternidade que o homem carrega dentro de si pela vida afora. A saudade de Deus é preenchida somente por Deus.

Daí a expressão de Santo Agostinho, logo no início, na primeira página de suas “Confissões”: “Fizeste-nos para ti, e inquieto está o nosso coração, enquanto não repousa em ti”. É por isso que ele veio ao nosso encontro, buscando-nos onde quer que nos encontremos perdidos no espaço físico, espiritual ou interior de nós mesmos. O sonho de Deus chega carregado de Si próprio na manifestação plena de sua extraordinária e frágil pequenez. Nasce como criança, vinda do seio de uma mulher, arrebentando os portões do mundo, com a grandeza de sua presença inaudita.

Na manjedoura de Belém está a paz que o homem procura para as guerras; a harmonia para o caos cósmico e universal; a felicidade plena para os infelizes; o calor humano para os frios e indiferentes; a esperança viva para os desesperados; a serenidade para os inquietos e agitados; a salvação para os perdidos; a consolação para os sofredores; a calmaria interior para os injustiçados; a fortaleza para os fracos; a graça redentora para os pecadores; a cura definitiva para as feridas da alma; a vitória para o fracasso; a verdadeira vida para a morte; a coragem do amor sem limites para os indecisos. Na manjedoura repousa a esperança do mundo adormecido em sua insensibilidade doentia. Nela está a libertação de todos os opróbrios.

Eis, pois, a grandeza de Cristo, o menino de Belém, luz que ilumina as trevas de todos os povos, acobertando os séculos com sua luminosidade infinita: “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz, uma luz raiou para os que habitavam uma terra sombria. Multiplicaste o povo, deste-lhe grande alegria; eles alegram-se na tua presença como se alegram os ceifadores na ceifa, como regozijam os que repartem os despojos. Porque o jugo que pesava sobre eles, o bastão posto sobre os seus ombros, a vara do opressor, tu os despedaçaste como no dia de Madiã. Com efeito, todo calçado que pisa ruidosamente no chão, toda a veste que se revolve no sangue serão queimadas, serão devoradas pelo fogo. Porque um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, ele recebeu o poder sobre os seus ombros, e lhe foi dado este nome: Conselheiro-maravilhoso, Deus-forte, Pai-eterno, Príncipe da paz, para que se multiplique o poder, assegurando o estabelecimento de uma paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu reino, firmando-o, consolidando-o sobre o direito e sobre a justiça. Desde agora e para sempre, o amor ciumento do Senhor dos Exércitos fará isso”. (Is 9,1-6).

Contemplando a manjedoura do menino-Deus, nascido em Belém, devemos recordar a bondade misericordiosa do Senhor que, do alto de sua Transcendência e inacessibilidade, chega ao nosso meio e se permite ser tocado pelas nossas feridas mais profundas. Mais do que isso: “Aquele que não conhecera o pecado, Deus o fez pecado por causa de nós, a fim de que, por ele, nos tornemos justiça de Deus”. (2Cor 5,21). A estrela de Natal que brilha no horizonte de nossa existência não tem nada a ver conosco e, no entanto, veio na intenção de que sejamos restaurados nele. Ou seja: Cristo nasce para o mundo, a fim de que nós possamos nascer para os céus.

Ó pobre criança de Belém, teu nascimento enche de luz todos os caminhos dos homens e do mundo inteiro. Assumindo a nossa humanidade, tu nos revestes com a glória de tua divindade. Carregando em Ti todas as mazelas de nossos pecados, tu nos devolves a graça perdida no Paraíso. Espoliado de tudo, até de tuas vestes, totalmente despido das riquezas humanas, que a ferrugem pode corroer, tu nos ensinas onde podemos encontrar a verdadeira dignidade, depois de todos os ultrajes sofridos pela injustiça dos homens. Tocando com tua humanidade todas as angústias do tempo e dos séculos, tu nos educas para a serenidade perene das consolações eternas. Enfim, chorando como todos os homens, tu nos mostras a compaixão divina por nossas fragilidades.

Muito obrigado, Jesus, porque no teu Natal tu continuas “nascendo no coração das pessoas de boa vontade, nos gestos de amor e partilha, nos povos que buscam a fraternidade e a paz”. Amém!