Sanctissimi Corporis et Sanguinis Christi
Todos os anos a Igreja de Cristo tem a alegria de celebrar um
dia exclusivamente dedicado ao Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo – Sollemnitas Sanctissimi Corporis et
Sanguinis Christi. Trata-se, pois, de uma solenidade que nasceu na Idade
Média, e fora proclamada oficialmente na
Igreja pelo Papa Urbano IV (1195-1264).
De
fato: “A Solenidade em honra ao Corpo do Senhor
– Corpus
Christi – que hoje celebramos na quinta-feira após a oitava de Pentecostes,
mais precisamente depois da festa
da Santíssima Trindade, é oficializada somente em 1264 pelo Papa Urbano IV”. Foi o próprio Senhor
e Mestre, Jesus de Nazaré, que desejou permanecer entre seus amigos – apóstolos
e discípulos – pelos séculos afora, sob as espécies do pão e do vinho, “fruto
da terra e do trabalho humano”, “fruto da videira”, que se tornam o “pão da
vida” eterna e o “vinho da salvação”. Portanto, um dia, na encruzilhada da história
humana, na celebração da última ceia, o Filho de Deus, antecipando o mistério
de sua cruz, diante dos apóstolos, assim se apresentou: “Tomai e comei, isto é
o meu corpo”; “Bebei dele todos, pois isto é o meu sangue, o sangue da Aliança,
que é derramado por muitos para a remissão dos pecados”. (Mt 26,27-28). Na
afirmação do Papa Bento XVI, “Toda a história de Deus com os homens está resumida nestas
palavras. Não foi só recolhido e interpretado no passado, mas antecipado também
no futuro a vinda do Reino de Deus ao mundo. Aquilo que Jesus diz, não são
simplesmente palavras. O que Jesus diz, é acontecimento, o acontecimento
central da história do mundo e da nossa vida pessoal”. (Corpus Christi, de
2006).
Depois, Cristo acrescentou: “Não beberei mais deste fruto da
videira até o dia em que convosco beberei o vinho novo no reino do meu Pai”.
(Mt 26,29). Como é grande o Mistério da nossa Fé!
O ato da cruz, realizado pela Pessoa do Verbo Eterno de Deus,
o Filho Unigênito, repercute na história da Salvação desde sempre, desde antes
da fundação do mundo, e percorre os séculos em direção à plenitude de sua obra
salvadora. É o que celebramos na terra por meio do Sacramento dos Sacramentos, a Eucaristia, penhor dos méritos da
paixão, morte e ressurreição de Cristo, o Senhor bendito pelos séculos dos
séculos. Ali, numa despedida, ele preanunciava sua permanência no meio de nós
até à eternidade. Segundo Angélico Poppi, exegeta do Novo Testamento, com a
expressão escatológica do versículo 29, Cristo exprime a certeza de sua
ressurreição após a morte. Assim, Mateus
sublinha, mais do que Marcos, a comensalidade com os discípulos, que serão
associados a Ele na beata participação no banquete escatológico, de que a
Eucaristia era uma prefiguração. E, dentro desse horizonte, o mesmo autor
conclui: “A partir de agora” (ap’ árti)
– uma expressão oculta na tradução, infelizmente – designa para Mateus o início
de um novo curso da história, isto é, do novo êxodo para os cristãos, que os
teria introduzido na verdadeira Terra prometida. Desse modo, a prospectiva da
morte sacrifical de Jesus resulta, assim, na visão radiosa do convívio
escatológico no reino do Pai celeste.
De algum modo, essa realidade se concretiza na celebração da
Santa Missa, conforme nos recorda o Catecismo da Igreja Católica: “A
Eucaristia é igualmente o sacrifício da Igreja. A Igreja, que é o corpo de Cristo,
participa na oblação da sua Cabeça. Com Ele, ela própria é oferecida
integralmente. Ela une-se à sua intercessão junto do Pai em favor de todos os
homens. Na Eucaristia, o sacrifício de Cristo torna-se também o sacrifício dos
membros do seu corpo. A vida dos fiéis, o seu louvor, o seu sofrimento, a sua
oração, o seu trabalho unem-se aos de Cristo e à sua oblação total, adquirindo
assim um novo valor. O sacrifício de Cristo presente sobre o altar proporciona
a todas as gerações de cristãos a possibilidade de se unirem à sua oblação”.
(Artigo 1368, CIC). A Eucaristia é a festa de todos os cristãos católicos, é o
sacrifício da imolação de Deus por nós na Pessoa do Filho.
Assumindo sua permanência no pão e no vinho, ele escolheu
símbolos da cotidianidade dos homens, o que expressa também a manifestação de
sua grandeza e sua imersão no meio de nós. Bento XVI esclarece essa dimensão de
participação entre os bens da natureza e sua imanência de fertilidade em favor
dos homens. Com efeito, “Durante
a procissão e a adoração nós olhamos para a Hóstia consagrada o tipo mais
simples de pão e de alimento, feito apenas com farinha e água. Assim vemo-lo
como o alimento dos pobres, aos quais em primeiro lugar o Senhor destinou a sua
proximidade. A oração com a qual a Igreja durante a liturgia da Missa entrega
este pão ao Senhor, qualifica-o como fruto da terra e do trabalho do homem.
Nele está contida a fadiga humana, o trabalho quotidiano de quem cultiva a
terra, semeia e recolhe e finalmente prepara o pão. Contudo, o pão não é
simples e somente o nosso produto, uma coisa feita por nós; é fruto da terra e
portanto também dom. Porque o fato que a terra dá frutos, não é merecimento
nosso; só o Criador lhe podia conferir a fertilidade. E agora podemos alargar
um pouco mais esta oração da Igreja, dizendo: o pão é fruto da terra e, ao
mesmo tempo, do céu”. (Corpus Christi, 2006). E desse modo,
o Senhor ostentou sua graça e seu poder salvador.
Hoje, no dia de cada geração cristã, toca a cada um de nós
usufruir de suas maravilhas manifestadas sacramentalmente na Igreja. Temos a
Eucaristia, que Cristo ofereceu ao Pai pela Salvação de todos como Ação de
graças. O convite permanece aberto a que nos ponhamos a caminho, com atitudes
de sincera conversão, não permitindo que as sombras do Mal se avantajem sobre
nós. Para tanto, precisamos trazer mais o Senhor Eucarístico diante de nós! Na
nossa vida, na nossa consciência, nas nossas ações, nos nossos encontros
comunitários, enfim, na liberdade interior com que devemos nos comprometer com
seu amor e sua misericórdia.
Que não percamos de vista a riqueza sacramental da Igreja, do
Senhor vivo e presente na hóstia consagrada. Na verdade, Ele é a hóstia
consagrada, mas, amiúde, a pobreza do vocabulário humano não atinge o alcance teológico
ou cristológico do conteúdo das palavras. No entanto, todos nós sabemos, pelo
menos intuitivamente, do que estamos falando.
Então, viva Cristo Eucarístico! Junte-se a nós nos louvores da comunidade paroquial. E viva Cristo Rei! (PGRS).