terça-feira, 14 de junho de 2022

 

Sanctissimi Corporis et Sanguinis Christi



Todos os anos a Igreja de Cristo tem a alegria de celebrar um dia exclusivamente dedicado ao Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo – Sollemnitas Sanctissimi Corporis et Sanguinis Christi. Trata-se, pois, de uma solenidade que nasceu na Idade Média, e fora proclamada oficialmente na Igreja pelo Papa Urbano IV (1195-1264).

De fato: “A Solenidade em honra ao Corpo do Senhor – Corpus Christi – que hoje celebramos na quinta-feira após a oitava de Pentecostes, mais precisamente depois da festa da Santíssima Trindade, é oficializada somente em 1264 pelo Papa Urbano IV”. Foi o próprio Senhor e Mestre, Jesus de Nazaré, que desejou permanecer entre seus amigos – apóstolos e discípulos – pelos séculos afora, sob as espécies do pão e do vinho, “fruto da terra e do trabalho humano”, “fruto da videira”, que se tornam o “pão da vida” eterna e o “vinho da salvação”. Portanto, um dia, na encruzilhada da história humana, na celebração da última ceia, o Filho de Deus, antecipando o mistério de sua cruz, diante dos apóstolos, assim se apresentou: “Tomai e comei, isto é o meu corpo”; “Bebei dele todos, pois isto é o meu sangue, o sangue da Aliança, que é derramado por muitos para a remissão dos pecados”. (Mt 26,27-28). Na afirmação do Papa Bento XVI, “Toda a história de Deus com os homens está resumida nestas palavras. Não foi só recolhido e interpretado no passado, mas antecipado também no futuro a vinda do Reino de Deus ao mundo. Aquilo que Jesus diz, não são simplesmente palavras. O que Jesus diz, é acontecimento, o acontecimento central da história do mundo e da nossa vida pessoal”. (Corpus Christi, de 2006).

Depois, Cristo acrescentou: “Não beberei mais deste fruto da videira até o dia em que convosco beberei o vinho novo no reino do meu Pai”. (Mt 26,29). Como é grande o Mistério da nossa Fé!

O ato da cruz, realizado pela Pessoa do Verbo Eterno de Deus, o Filho Unigênito, repercute na história da Salvação desde sempre, desde antes da fundação do mundo, e percorre os séculos em direção à plenitude de sua obra salvadora. É o que celebramos na terra por meio do Sacramento dos Sacramentos, a Eucaristia, penhor dos méritos da paixão, morte e ressurreição de Cristo, o Senhor bendito pelos séculos dos séculos. Ali, numa despedida, ele preanunciava sua permanência no meio de nós até à eternidade. Segundo Angélico Poppi, exegeta do Novo Testamento, com a expressão escatológica do versículo 29, Cristo exprime a certeza de sua ressurreição após a morte.  Assim, Mateus sublinha, mais do que Marcos, a comensalidade com os discípulos, que serão associados a Ele na beata participação no banquete escatológico, de que a Eucaristia era uma prefiguração. E, dentro desse horizonte, o mesmo autor conclui: “A partir de agora” (ap’ árti) – uma expressão oculta na tradução, infelizmente – designa para Mateus o início de um novo curso da história, isto é, do novo êxodo para os cristãos, que os teria introduzido na verdadeira Terra prometida. Desse modo, a prospectiva da morte sacrifical de Jesus resulta, assim, na visão radiosa do convívio escatológico no reino do Pai celeste.

De algum modo, essa realidade se concretiza na celebração da Santa Missa, conforme nos recorda o Catecismo da Igreja Católica: “A Eucaristia é igualmente o sacrifício da Igreja. A Igreja, que é o corpo de Cristo, participa na oblação da sua Cabeça. Com Ele, ela própria é oferecida integralmente. Ela une-se à sua intercessão junto do Pai em favor de todos os homens. Na Eucaristia, o sacrifício de Cristo torna-se também o sacrifício dos membros do seu corpo. A vida dos fiéis, o seu louvor, o seu sofrimento, a sua oração, o seu trabalho unem-se aos de Cristo e à sua oblação total, adquirindo assim um novo valor. O sacrifício de Cristo presente sobre o altar proporciona a todas as gerações de cristãos a possibilidade de se unirem à sua oblação”. (Artigo 1368, CIC). A Eucaristia é a festa de todos os cristãos católicos, é o sacrifício da imolação de Deus por nós na Pessoa do Filho.

Assumindo sua permanência no pão e no vinho, ele escolheu símbolos da cotidianidade dos homens, o que expressa também a manifestação de sua grandeza e sua imersão no meio de nós. Bento XVI esclarece essa dimensão de participação entre os bens da natureza e sua imanência de fertilidade em favor dos homens. Com efeito, “Durante a procissão e a adoração nós olhamos para a Hóstia consagrada o tipo mais simples de pão e de alimento, feito apenas com farinha e água. Assim vemo-lo como o alimento dos pobres, aos quais em primeiro lugar o Senhor destinou a sua proximidade. A oração com a qual a Igreja durante a liturgia da Missa entrega este pão ao Senhor, qualifica-o como fruto da terra e do trabalho do homem. Nele está contida a fadiga humana, o trabalho quotidiano de quem cultiva a terra, semeia e recolhe e finalmente prepara o pão. Contudo, o pão não é simples e somente o nosso produto, uma coisa feita por nós; é fruto da terra e portanto também dom. Porque o fato que a terra dá frutos, não é merecimento nosso; só o Criador lhe podia conferir a fertilidade. E agora podemos alargar um pouco mais esta oração da Igreja, dizendo: o pão é fruto da terra e, ao mesmo tempo, do céu”. (Corpus Christi, 2006). E desse modo, o Senhor ostentou sua graça e seu poder salvador.

Hoje, no dia de cada geração cristã, toca a cada um de nós usufruir de suas maravilhas manifestadas sacramentalmente na Igreja. Temos a Eucaristia, que Cristo ofereceu ao Pai pela Salvação de todos como Ação de graças. O convite permanece aberto a que nos ponhamos a caminho, com atitudes de sincera conversão, não permitindo que as sombras do Mal se avantajem sobre nós. Para tanto, precisamos trazer mais o Senhor Eucarístico diante de nós! Na nossa vida, na nossa consciência, nas nossas ações, nos nossos encontros comunitários, enfim, na liberdade interior com que devemos nos comprometer com seu amor e sua misericórdia.

Que não percamos de vista a riqueza sacramental da Igreja, do Senhor vivo e presente na hóstia consagrada. Na verdade, Ele é a hóstia consagrada, mas, amiúde, a pobreza do vocabulário humano não atinge o alcance teológico ou cristológico do conteúdo das palavras. No entanto, todos nós sabemos, pelo menos intuitivamente, do que estamos falando.

Então, viva Cristo Eucarístico! Junte-se a nós nos louvores da comunidade paroquial. E viva Cristo Rei! (PGRS).