Saudades do Carnaval?
Saudades do Carnaval? Sim! “Saudades do Carnaval” é o sentimento de
folia que tem repaginado a vida de muitas pessoas, Brasil afora, depois da
suposta passagem da pandemia do Covid-19, uma tragédia humanitária que, só no
país “verde e amarelo”, fez desaparecerem quase 700 mil pessoas. Então, as ruas
começam a ser tomadas pelos foliões que se reúnem para a “celebração da vida”,
diriam alguns. Por mais de dois anos afastados das passarelas do samba, eis que
tudo parece voltar a todo vapor! E a pandemia já nos deixou em paz? Quanto aos
que morreram, esses, sim, descansam em paz, porque o tumulto das nações
silencia nos cemitérios.
O carnaval não é uma necessidade essencial da alma nem do espírito
humano. Desse modo, sua substância é, sobretudo, de sede espiritual e de fome
de Deus! Ou melhor: De Saudade de Deus! E esse deveria ser o grito dos
cristãos: “Saudade de Deus!”. Infelizmente, com o afastamento moroso da sombra
da pandemia, que assustou a todos no mundo inteiro, parece que a maioria das
Igrejas ainda vazias sinaliza que vivemos, de veras, esquecidos de Deus. Alguns
não voltaram, talvez, porque se descobriram não necessitados de Deus; outros,
por acomodação mesmo, imaginando uma igrejinha doméstica, que não alcança o
sentido pleno da eclesiologia; e outros ainda, porque esfriaram na fé, perderam
o sentido da vida em comunidade e, assim, se isolaram. Mas Deus não nos
esqueceu! Portanto, precisamos recobrar o caminho da gratidão, voltar à vida da
comunidade na Igreja e nos alegrar com o fato de ainda estarmos aqui, vivos,
celebrando os louvores do nosso Deus Criador e Salvador. É, pois, nessa direção
que queremos caminhar durante o tempo forte, de oração e penitência para os
cristãos católicos, com o advento do período da Quaresma!
Não é por acaso que “a Quaresma, que nos conduz à celebração da
Santa Páscoa, é para a Igreja um tempo litúrgico muito precioso e importante,
em vista do qual me sinto feliz por dirigir uma palavra específica para que
seja vivido com o devido empenho. Enquanto olha para o centro definitivo com o
seu Esposo na Páscoa eterna, a Comunidade eclesial, assídua na oração e na
caridade laboriosa, intensifica o seu caminho de purificação no espírito, para
haurir com mais abundância do Mistério da redenção a vida nova em Cristo Senhor
(cf. Prefácio I da Quaresma”). (Bento XVI).
Uma palavra do saudoso Bento XVI ainda em vigor! É a perenidade da Palavra de
Deus que se desdobra nos ensinamentos da Igreja de Cristo através dos papas, do
magistério, da tradição e da doutrina católica. Tudo, porém, fundamentado nas
Sagradas Escrituras, sobretudo nos Evangelhos de Cristo.
Ou seja, um universo de diretrizes éticas e espirituais que devem
elevar os homens à transcendência própria de sua altíssima dignidade. A dignidade
de Filhos de Deus: “Com efeito, não recebestes um espírito de escravos, para
recair no temor, mas recebestes um espírito de filhos adotivos, pelo qual
clamamos: Abba! Pai! O próprio
Espírito se une ao nosso espírito para testemunhar que somos filhos de Deus. E
se somos filhos, somos também herdeiros; herdeiros de Deus e coerdeiros de
Cristo, pois sofremos com ele para também com ele sermos glorificados”. (Rm
8,15-16). Sofrimento e glória, dois termos que São Paulo aponta
aos cristãos, a fim de que não esqueçamos a dinâmica do binário espiritual aqui
enfatizado. De fato, à luz cristológica, não há glória sem sofrimento. Aliás,
essa é uma das tentações de satanás contra o Filho de Deus: para que passar
pelo sofrimento, se é possível a glória sem ele? (“Tudo isto te darei, se,
prostrado, me adorares”, Mc 4,9). Trata-se, pois, de uma enganação do diabo que
tem inspirado a vida de muitos falsos discípulos de Cristo, porque tentam criar
a sua própria religião.
Que o tempo novo da liturgia da Igreja, que é a Quaresma, conduza-nos
a melhor entender o caminho da Cruz percorrido por Cristo para nossa salvação
eterna. Piedade, amor, jejuns e orações, tudo isso ao lado da esmola – que é
mais do que o simples gesto de doar algo a alguém – inspire-nos a bem viver
esse período de penitência. Na verdade, contemplando o Cristo da cruz, de algum
modo, contemplamo-nos a nós mesmos pelo mistério da Encarnação daquele que
carregou sobre si as nossas feridas espirituais mais profundas, como consequências
do pecado da desobediência de Adão e Eva.
O tempo santo da Quaresma deve ser também para nossa infinita
gratidão ao Pai Criador, ao Filho Salvador e ao Espírito Santificador, pelos
benefícios advindos da Cruz do Senhor nosso Jesus Cristo. (Dr. PGRS).
Feliz e Santa Quaresma!
2023