segunda-feira, 3 de abril de 2023

O drama da paixão de Cristo

 

O drama da paixão de Cristo

 


O drama da Paixão de Cristo encerra o ministério da nossa salvação eterna! Na verdade, o que Cristo veio fazer entre nós? Qual o sentido último da sua Encarnação, da sua Paixão, da sua Morte e da sua Ressurreição? De fato, a história da salvação começa com a antiga promessa que Deus fizera de nos enviar o Salvador. E ela se encontra, lá, na origem da Criação, quando ao criar o homem à sua imagem e semelhança (Gn 1,27), ele se rebelou contra o Criador mediante a insinuação da serpente tentadora, que semeou a inimizade entre Deus e a criatura humana. Assim, aquela resistência à vontade do Criador abriu o precedente radical que nos tornou prisioneiros do maligno. Contudo, o Pai, santo e misericordioso, não quis deixar-nos entregues à nossa própria sorte. E, por isso, prometeu: “Porei hostilidade entre ti e a mulher, entre tua linhagem e a linhagem dela. Ela te esmagará a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar...” (Gn 3,15).

Esse texto do Antigo Testamento é considerado pelos grandes exegetas como o protoevangelho, isto é, a primeira boa nova alvissareira do nosso resgate espiritual para Deus. Assim, tal “versículo constata a hostilidade fundamental entre a serpente a humanidade, mas deixa entrever a vitória final da humanidade: é um primeiro clarão de salvação, ou Proto-evangelho. A tradução grega [...] atribui essa vitória não à linhagem da mulher em geral, mas a um dos filhos da mulher; dessa forma, é estimulada a interpretação messiânica já presente na tradição judaica antiga, depois retomada e explicitada por muitos Padres da Igreja”. (BJ, 2004, p. 38, nota “a”). Dessarte, “quando o homem consegue mostrar o que tem de pior e atingir seu ponto mais baixo, Deus lhe dá um recomeço”. (Wiersbe). Ou seja: no próprio alvorecer do nosso afastamento de Deus, está também a sublimidade misteriosa, bem longínqua, bem distante, da nossa Redenção, embora, no vislumbre da onisciência divina, esse rasgo de claridade intensa aconteça no relâmpago de sua visão universal, cosmogênica-transcendental. Com efeito, na intuição luminosa da divindade, a abrangência histórica da salvação é um clarão de plenitude experimentada somente por Deus, onisciente, onipresente e onipotente. Portanto, nossa visão míope, extremamente contaminada pela tiflose espiritual, reforçada pelo pecado, apenas saboreia o minimalismo radical dessa percepção, porque também é um dom da inteligência com que fomos dotados. No entanto, o Criador precisou preparar o coração da humanidade para o mistério de sua própria salvação, transcorrida na história mediante a revelação do próprio Deus.

Os séculos foram avançando, e Deus mesmo se encarregou de revelar o seu plano de amor incondicional pela criatura humana, enviou seus mensageiros, suscitou os profetas, fez resplandecer nos eventos históricos as maravilhas de seu poder, até fazer despontar a luz do Salvador outrora prometido. Desse modo, “quando, porém, chegou a plenitude do tempo, enviou Deus o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob a Lei, para resgatar os que estavam sob a Lei, a fim de que recebêssemos a adoção filial”. (Gl 4,4). Ele é o “Cordeiro imolado” desde a fundação do mundo, quando já detinha o “livro da Vida”. (Ap 13,8). E foi por meio do Filho que Deus olhou a cada um de nós, derramando sobre todos os dons infinitos e espirituais de sua misericórdia, mesmo se “O amor de Deus pelo pecador, de maneira alguma elimina sua abominação santa pelo pecado, pois, ainda que seja verdade que ‘Deus é amor’ (1 Jo 4,8), também é verdade que ‘Deus é luz’ (1Jo 1,5). Um Deus santo deve tratar do pecado, para o bem do pecador e para a glória de seu nome”. (Wiersbe). É o que Deus faz pela Pessoa do Filho, historicamente, durante o Drama da Paixão de Cristo, na Semana Santa! Por isso, somos chamados a viver esses dias com piedade, gratidão e esforço mais intenso de conversão ao seu amor. Outrossim, “Já se aproximam os dias de sua Paixão salvadora e de sua gloriosa Ressurreição. Dias em que celebramos, com fervor, a vitória sobre o antigo inimigo e entramos no mistério da nossa Redenção”. (Prefácio da Paixão do Senhor, II).

O Catecismo da Igreja Católica (CIC, n. 41), é bastante esclarecedor quando afirma: “Nenhum homem, ainda que o mais santo, tinha condições de tomar sobre si os pecados de todos os homens e de oferecer-se em sacrifício por todos. A existência em Cristo da Pessoa Divina do Filho, que supera e, ao mesmo tempo, abraça todas as pessoas humanas, e que o constitui Cabeça de toda a humanidade, torna possível seu sacrifício redentor por todos”.

A semana santa nos ajude a ver o Senhor da Glória no seu caminho de humilhação, de sofrimento e de morte – pela via sacra – e desperte nosso coração renovado no resplendor de sua Ressurreição. Assim, Senhor, “que o nosso pecado seja assumido pela tua graça redentora e santificante; nossa fraqueza, pela tua força; nossas lágrimas, pela tua consolação; nossa inquietação, pela tua serenidade; nosso egoísmo, pela tua mortificação; nossa covardia, pela tua coragem de amar até o fim; nossa impaciência, pela tua paciência; nossas feridas, pelas tuas chagas; nosso dilaceramento, pela plenitude de tua integridade; nossas lamentações, pelo teu silêncio; nosso fracasso, pela tua vitória; nossa nulidade, pela tua perfeição; nossa vida, pela tua morte, que gera a verdadeira vida; nossa morte, pela tua Ressurreição; nossa ressurreição, pela eternidade de Deus...” Amém! (Dr. PGRS).