A Caminho de Jerusalém
Nem
todo mundo que vai para Jerusalém deve passar necessariamente por Londres, mas
comigo isso aconteceu. Na verdade, o projeto de passar por Londres em direção a
Jerusalém não estava no meu esquema de vida pessoal até o dia 14 de janeiro de
2014, quando o Arcebispo Metropolitano de Aracaju, Dom José Palmeira Lessa, comunicou-me
a decisão de permitir que eu fosse aprofundar meus estudos em algum lugar do
mundo. Tudo era muito novo. Nem mesmo a ideia de que eu poderia me ausentar da
Arquidiocese por dois anos estava em meus planos. Como eu já havia morado em
Roma quatro anos, onde fiz o mestrado e Teologia Bíblica pela Pontifícia
Universidade Gregoriana, optei por conhecer outro lugar, cuja língua também
seria um desafio para os códigos intelectivos da inteligência.
O
conhecimento de qualquer língua nova é sempre um desafio muito grande,
sobretudo, quando as teias da memória se tornam mais invadidas pela espessura
dos nós com que o tempo se encarrega de obstruir a liberdade do conhecimento. Em
2005, quando eu estive em Jerusalém pela primeira vez, dada a tranquilidade do
lugar, um dos pedidos que fiz a Deus foi o de, um dia, poder voltar para morar
ali, pelo menos, dois anos. Foi o que me aconteceu, pois tudo eu recebi como um
grande presente de Deus. Hoje, diante dos desafios do mundo moderno nada é
muito fácil. Tudo custa muito caro. A estada nos lugares, o preço que temos de
pagar pelo acesso à cultura e às informações que se sedimentam na constituição
do patrimônio do saber, tudo é avaliado a preço de ouro pelas exigências dos
deslocamentos. A cultura não é fruto da graça infusa, que chega aos porões da
mente – ou às portas da alma – sem o esforço necessário à sua aquisição. Quem correu
atrás dela sabe o quanto pagou. É que a busca pelo saber arranca dos
interessados todas as energias factuais de seus desejos de conquista. Sem medo,
eles se lançam na aventura fascinante pelo desconhecido e por ele assumem todos
os riscos imprevisíveis de sua aparente loucura. No caso dos crentes, como
acontece na vida do sacerdote, trata-se de um verdadeiro ato de fé, quando, por
disposição divina, ele abandona todas as suas seguranças para se arriscar nas
ondas revoltas do mar existencial que não está totalmente claro no horizonte de
suas certezas.
Inicialmente,
somos tomados pelo entusiasmo próprio de quem não pode deixar passarem as
chances da realização de seus sonhos. Tudo parece se transformar dentro da
mente e das dobras do espírito quando o choque de conjunturas assim surpreendem
as portas da existência. O ritmo da vida assume contornos de empolgação e
vibrações em demanda das reais condições da concretude, de tal maneira que as
expectativas do dia a dia em relação aos afazeres se tornam condicionados pela
inércia de objetivos que nos deixam quase perdidos quanto ao que deveríamos
fazer com mais concentração. A euforia tenta transtornar o equilíbrio interior
em detrimento da serenidade que devemos carregar conosco em situações de
imprevisibilidade. A ansiedade toma conta de nós como quando estamos dentro de
uma aeronave em pleno voo, e percebemos que as turbulências externas
influenciam negativamente a tranquilidade dos passageiros. E isso nos persegue
até que as nuvens sombreadas pelas incertezas desapareçam da visibilidade do
olhar, o que pode levar algum tempo.
Depois
dos arroubos iniciais das provocações do destino, vem o tempo das batalhas
pelas portas que deverão se abrir para que tudo se concretize, até passar,
inclusive, pelo momento em que se pensa que nada será possível, e que tudo
parece fadado ao fracasso e à mais completa frustração. Tudo consequência da
não onisciência humana. Não podemos saber tudo ao mesmo tempo, embora nossas
limitações nesse sentido devam convergir para os anseios da esperança. Da
esperança que ilumina os propósitos de nossas conquistas. Ela é a motivação
maior que nos conduz adiante, com perseverança e teimosia, almejando que tudo
dê certo e se realize de verdade. A porta dos sonhos só se fecha para quem não
tem a coragem de abri-la. Com efeito, a vida é uma passagem, de modo que não
podemos nos deter paralisados no limiar do medo. Na verdade, a grandeza que o
homem carrega dentro de si também é fruto de suas ousadias. Se assim não o
fosse, quantas de suas conquistas e vitórias não teriam se perdido na fumaça
obscura do tempo?
São as surpresas da vida de todos os dias!