A inauguração de
um tempo novo
Com a chegada e os anúncios da
celebração do Natal do Senhor, eis que, assumindo nossa humanidade, o próprio
Cristo inaugura um tempo novo. Assim, celebrar o Natal de Jesus é, pois,
carregar dentro da humildade de nossa consciência a certeza de que Deus está
mais próximo de nós do que nunca.
Se antes de sua chegada, cada um andava
errante – como afirma o profeta Isaías, pois “todos nós andávamos errantes,
seguindo cada um o seu próprio caminho” – agora, com o advento de sua presença,
todos nós podemos retomar a estrada da reconciliação com ele, porquanto “Iahweh
fez cair sobre ele a iniquidade de todos nós” (Is 53,6). Por isso que na
celebração do Natal do Senhor, a Igreja não dissocia o efeito salvífico de seu
nascimento à sua vida inteira, culminando na sua Paixão, Morte e Ressurreição.
Por exemplo, quem já teve a oportunidade de contemplar algum ícone oriental do
nascimento de Cristo, o menino-Deus, deve ter percebido que ele é apresentado
envolvido em lençóis mortuários. Realmente, a inteligência divina não é
racional como a nossa, que se determina pela dinâmica do ontem, do hoje e do
amanhã, incluindo um “antes” e um “depois”. A visibilidade de Deus atinge todos
os pontos da existência no “hoje” ou no “agora” de sua eternidade.
Nessa dimensão de raciocínio, entrando
na história dos homens, Cristo, humildemente, submeteu-se às condições
temporais e se fez igual a nós em tudo, “provado em tudo como nós, com exceção
do pecado” (Hb 4,15). Ele também cresceu “em sabedoria, em estatura e em graça
diante de Deus e dos homens” (Lc 2,52). Contudo, nada da sua existência humana
diminuiu a sua divindade. Assim, a Igreja o reconhece “verdadeiro Deus e
verdadeiro homem”. Embora com duas naturezas – a natureza humana e a divina –
ele é uma pessoa só. Não são duas pessoas que habitam o Cristo. Com certeza,
muito complexo parece ser o dogma da Igreja na correta e justa compreensão da
pessoa do Filho de Deus. Todavia, o pensamento do Papa Bento XVI ilumina com
mais clarividência o alcance da ideia que tentamos elaborar, pois Cristo, ao se
“fazer carne”, permite que nos vejamos “colocados diante de um princípio de caráter absoluto e que
narra a vida íntima de Deus. O Prólogo joanino apresenta-nos o fato de que o Logos existe realmente desde sempre, e desde sempre Ele mesmo é Deus. Por conseguinte, nunca
houve em Deus um tempo em que não existisse o Logos. O Verbo preexiste à criação” (Exortação pós-sinodal Verbum Domini, n. 6).
Mesmo se de difícil acesso intelectivo,
nem por isso, devemos deixar de esforçar-nos para adquirir maior conhecimento
sobre os desdobramentos da teologia ou da cristologia a respeito do Filho de
Deus, que, especialmente no Natal, manifesta-se dialogando com a nossa
humanidade.