Experiências do Povo de Israel
Muitas
experiências duras do povo de Israel, tais como a escravidão no Egito, o tempo
de errância durante o Êxodo, as dificuldades do percurso em direção à Terra
Prometida, a opressão das nações vizinhas e dos impérios tiranos que o
subjugaram, e o Exílio na Babilônia, tudo o levou ao sofrimento.
A
expressão é do próprio salmista: “À beira dos canais de Babilônia nos sentamos,
e choramos com saudades de Sião; [...] Lá os que nos exilaram pediam canções,
nossos raptores queriam alegria: ‘Cantai-nos um canto de Sião!’ Como poderíamos
cantar um canto de Iahweh numa terra estrangeira?” (Sl 137,1-4). A literatura
sapiencial sobeja em testemunhos vivos de dor e tristeza do povo eleito do
Senhor. Mas não é somente a literatura espiritual sobre os desconfortos da alma
que nos interessa. Precisamos ir mais além e perguntar-nos como isso se aplica
na vida prática, ou melhor, como estamos dispostos a enfrentar os percalços
espinhosos de sua concretude. De nada adianta o intelectualismo frio das
palavras, sem a aplicabilidade coerente do conteúdo mordaz de suas atribuições
nas fissuras interiores da vida em si mesma.
São
Paulo não fala de maneira fantasiosa. Ele está no olho do furacão das
controvérsias reais de situações difíceis que parecem rebentar as barreiras de
todas as suas resistências. Mas ele permanece firme, na fidelidade ao seu
Senhor. Ele sabe, realmente, em quem depositou a sua fé (2Tm 1,12). E nada
poderá demovê-lo do posto em que se encontra, sempre olhando adiante, com os
olhos fixos no autor e realizador da própria fé, Cristo Jesus (Hb 12),
inclusive, estando disposto a permitir que sua vida se derramasse em sacrifício
de libação, pois “se o meu sangue for derramado
em libação, em sacrifício e serviço da vossa fé, alegro-me e me regozijo
com todos vós; e vós também alegrai-vos e regozijai-vos comigo” (Fl 2,17).
Envolvido totalmente com Cristo e a causa do evangelho, sua consciência límpida
e transparente não o autoriza a dispensar-se da exigência mais radical de seu
testemunho, o martírio, expressão máxima do abandono e da confiança no Senhor,
justo Juiz, que lhe garantiu a coroa da vitória.
Na
expressão do Papa Bento XVI, “Paulo era um homem disposto a deixar-se ferir e
era esta exatamente a sua força. Não se protegeu, não tentou tirar o corpo fora
das contrariedades e das circunstâncias desagradáveis, menos ainda procurou
garantir para si uma vida tranquila”. E mais adiante, continua o Romano
Pontífice: “Paulo não pensava absolutamente que o dever prioritário da pastoral
fosse evitar as dificuldades e não considerava que um apóstolo devesse em
primeiro lugar preocupar-se em ter a opinião pública ao seu lado. Não, ele
queria sacudir, romper o sono das consciências, até às custas da vida. [...] Também
hoje a Igreja poderá convencer as pessoas somente à medida que os anunciadores
estiverem dispostos a deixar-se ferir. Onde falta disponibilidade em sofrer
pessoalmente, falta o tema decisivo da verdade, do qual a própria Igreja
depende. Sua batalha será sempre e somente a batalha dos que aceitam
sacrificar-se: a batalha dos mártires”.
Ser cristão nos tempos modernos também
é isto, quer dizer, arriscar tudo por causa de Cristo e da pregação do
Evangelho, com o radicalismo ao qual, nem sempre, parecemos muito dispostos a
levá-lo até às últimas consequências.