quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Manonas assassino


Mamōnas Assassino

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Inicialmente, para evitar conclusões precipitadas por parte do leitor, gostaria de, tanto quanto possível, familiarizá-lo com o provável significado da palavra grega “mamōnas”, que no contexto dos evangelhos de Mateus (6,24) e Lucas (16,9.11.13) vem traduzida por “dinheiro”. Ou seja, nada do que, talvez, de chofre, tenha sido excogitado pela inspiração associativa do incipiente ledor.
Na verdade, em todo o Novo Testamento, ela aparece com essa tradução grega apenas nessas citações. Segundo F. Hauck, o termo grego “mamōnas” reproduz o estado enfático “māmônâ” do substantivo aramaico de uso comum “māmôn”, embora seja um vocábulo de etimologia incerta. Pode parecer estranho, mas sua derivação mais verossímil tem a ver com ’mn, isto é, “aquilo em que se pode depositar a própria confiança”. Somente a título de curiosidade, esses três símbolos são a transliteração da palavra “amén” do hebraico, tão inconscientemente repetida em nossas orações, no sentido de confirmação, aceitação e verdade do conteúdo apresentado na alocução apenas referida. Com muita frequência, Jesus a utiliza para introduzir muito de seus discursos: “amēn!, amēn!”,– “Em verdade, em verdade, eu vos digo” (Mt 5,18.26; 6,2.5.16; 8,10; 10,15,23.42). Cito apenas alguns exemplos, pois ela é citada 128 vezes no NT. No contexto da citação do evangelista Lucas, referindo-se a um “administrador infiel” (16,1-13), Jesus fala do “dinheiro iníquo” ou “dinheiro da iniquidade”. Mas aludindo aos fariseus como “amigos do dinheiro”, o evangelista usa um termo diferente: “philargyros”, um adjetivo que significa “ávido por dinheiro” e, como diz o ditado, “avarus semper egit” – “o avarento sempre tem necessidade”. Desse modo, tal crítica é fundamental para que se possa compreender o verdadeiro alcance que motiva a reflexão sobre os caminhos desencontrados do exagerado apego ao dinheiro, porque, como diria São Paulo, “a raiz de todos os males é o amor ao dinheiro [“philargyria” – avareza por dinheiro], por cujo desenfreado desejo alguns se afastaram da fé, e a si mesmos se afligem com múltiplos tormentos” (1Tm 6,10). Como poderia o “mamōnas” afastar alguém da fé? Não precisamos de muita intuição para descobrir o quanto o materialismo tem levado as pessoas ao afastamento de Deus.

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Comparando os continentes ricos e pobres, escrevi no livro “As Letras e as Palavras na Crônica dos Pensamentos” (p. 107) que “paulatinamente, o materialismo fechou o coração do homem para a realidade do transcendente, do divino, do eterno; obnubilou e escureceu a sua consciência para as verdades intrínsecas ao seu próprio destino. Ninguém mais se pergunta quem somos, de onde viemos e para onde vamos. O materialismo assumiu o lugar de Deus na roupagem provisória da autossuficiência. Como sentir falta de Deus quem não sente falta material de nada? Jesus tinha razão quando dizia: ‘Bem-aventurados os pobres de espírito porque deles é o reino dos céus’. Somente quem se sente pobre pode estar aberto à grandeza da transcendência de Deus. Só em Deus, o homem encontra a satisfação plena de sua dignidade, pois, se nos deixarmos levar pela arrogância intelectual do nosso racionalismo, acabamos por perder a fé no Deus de Jesus Cristo, cuja revelação e ministério a nossa razão não consegue explicar suficientemente”. Morando na Europa ou na África, o nível de convivência e de manifestação de proximidade entre as pessoas é diferente. O mesmo, eu diria, vale para a experiência de se habitar em um bairro rico ou pobre. A felicidade espontânea dos menos afortunados salta aos olhos de qualquer pessoa, e o estresse cansativo do quotidiano afeta menos o bom humor hilariante da pobreza. Outra ponta aguda dessa “potência” em prover as próprias necessidades, pode ser vista pelo ângulo da nossa incapacidade de, repentinamente, perceber que temos muita dificuldade em aceitar que não nos bastamos a nós mesmos, ou em admitir que Deus é a fonte cristalina de nossa existência. O dinheiro, a opulência, a riqueza, nada disso garante a vida de um homem, pois, como diz Jesus, “mesmo na abundância, a vida do homem não é assegurada por seus bens” (Lc 12,15).

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No Antigo Testamento, talvez seja em Gn 42,25 que, pela primeira vez, aparece o termo “dinheiro”: “José deu ordem de encher de trigo suas sacas, de restituir o dinheiro [“argyrion”] de cada um em sua bolsa e lhe dar provisões para o caminho”. Todavia, perlustrando o texto sagrado, gostaria de trazer a lume alguns textos de conotação, fortemente, negativa, porquanto neles se revela o aspecto perverso e corruptor causado pelo apego desmedido ao dinheiro, ao “mamōnas”: “Quem ama o dinheiro, nunca está fardo de dinheiro, quem ama a abundância nunca tem vantagem” (Ecl 5,9). Em outras palavras, o dinheiro “não é garantia de vida nem fonte de felicidade” para ninguém. Daí que o ensinamento de Cristo se fundamenta no desapego, no desprendimento, como em Mt 6,19-21.24.25-34. Cristo incita seus discípulos ao abandono à Providencia divina que cuida, não somente dos pássaros do céu, mas, sobretudo, da obra-prima de suas criaturas, o homem. É, pois, nesse contexto de confiança e entrega que Jesus convida o jovem rico a vender os bens e dar aos pobres, reservando para si um tesouro nos céus. O moço, porém, “possuidor de muitos bens” (Mt 19,22) foi embora pesaroso e triste por não conseguir desapegar-se de suas aparentes garantias materiais.