sábado, 23 de agosto de 2014

A caminho de Jerusalém


A Caminho de Jerusalém

 


Nem todo mundo que vai para Jerusalém deve passar necessariamente por Londres, mas comigo isso aconteceu. Na verdade, o projeto de passar por Londres em direção a Jerusalém não estava no meu esquema de vida pessoal até o dia 14 de janeiro de 2014, quando o Arcebispo Metropolitano de Aracaju, Dom José Palmeira Lessa, comunicou-me a decisão de permitir que eu fosse aprofundar meus estudos em algum lugar do mundo. Tudo era muito novo. Nem mesmo a ideia de que eu poderia me ausentar da Arquidiocese por dois anos estava em meus planos. Como eu já havia morado em Roma quatro anos, onde fiz o mestrado e Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana, optei por conhecer outro lugar, cuja língua também seria um desafio para os códigos intelectivos da inteligência. 



O conhecimento de qualquer língua nova é sempre um desafio muito grande, sobretudo, quando as teias da memória se tornam mais invadidas pela espessura dos nós com que o tempo se encarrega de obstruir a liberdade do conhecimento. Em 2005, quando eu estive em Jerusalém pela primeira vez, dada a tranquilidade do lugar, um dos pedidos que fiz a Deus foi o de, um dia, poder voltar para morar ali, pelo menos, dois anos. Foi o que me aconteceu, pois tudo eu recebi como um grande presente de Deus. Hoje, diante dos desafios do mundo moderno nada é muito fácil. Tudo custa muito caro. A estada nos lugares, o preço que temos de pagar pelo acesso à cultura e às informações que se sedimentam na constituição do patrimônio do saber, tudo é avaliado a preço de ouro pelas exigências dos deslocamentos. A cultura não é fruto da graça infusa, que chega aos porões da mente – ou às portas da alma – sem o esforço necessário à sua aquisição. Quem correu atrás dela sabe o quanto pagou. É que a busca pelo saber arranca dos interessados todas as energias factuais de seus desejos de conquista. Sem medo, eles se lançam na aventura fascinante pelo desconhecido e por ele assumem todos os riscos imprevisíveis de sua aparente loucura. No caso dos crentes, como acontece na vida do sacerdote, trata-se de um verdadeiro ato de fé, quando, por disposição divina, ele abandona todas as suas seguranças para se arriscar nas ondas revoltas do mar existencial que não está totalmente claro no horizonte de suas certezas. 


Inicialmente, somos tomados pelo entusiasmo próprio de quem não pode deixar passarem as chances da realização de seus sonhos. Tudo parece se transformar dentro da mente e das dobras do espírito quando o choque de conjunturas assim surpreendem as portas da existência. O ritmo da vida assume contornos de empolgação e vibrações em demanda das reais condições da concretude, de tal maneira que as expectativas do dia a dia em relação aos afazeres se tornam condicionados pela inércia de objetivos que nos deixam quase perdidos quanto ao que deveríamos fazer com mais concentração. A euforia tenta transtornar o equilíbrio interior em detrimento da serenidade que devemos carregar conosco em situações de imprevisibilidade. A ansiedade toma conta de nós como quando estamos dentro de uma aeronave em pleno voo, e percebemos que as turbulências externas influenciam negativamente a tranquilidade dos passageiros. E isso nos persegue até que as nuvens sombreadas pelas incertezas desapareçam da visibilidade do olhar, o que pode levar algum tempo. 

 


Depois dos arroubos iniciais das provocações do destino, vem o tempo das batalhas pelas portas que deverão se abrir para que tudo se concretize, até passar, inclusive, pelo momento em que se pensa que nada será possível, e que tudo parece fadado ao fracasso e à mais completa frustração. Tudo consequência da não onisciência humana. Não podemos saber tudo ao mesmo tempo, embora nossas limitações nesse sentido devam convergir para os anseios da esperança. Da esperança que ilumina os propósitos de nossas conquistas. Ela é a motivação maior que nos conduz adiante, com perseverança e teimosia, almejando que tudo dê certo e se realize de verdade. A porta dos sonhos só se fecha para quem não tem a coragem de abri-la. Com efeito, a vida é uma passagem, de modo que não podemos nos deter paralisados no limiar do medo. Na verdade, a grandeza que o homem carrega dentro de si também é fruto de suas ousadias. Se assim não o fosse, quantas de suas conquistas e vitórias não teriam se perdido na fumaça obscura do tempo? 

 

São as surpresas da vida de todos os dias!