domingo, 21 de setembro de 2014

Mudanças Culturais

Mudanças culturais


Sonho com o dia em que a região do Próximo Oriente Médio – e de todo o Oriente – se torne um lugar tão democrático e livre em suas questões políticas e sociais, inclusive, envolvendo as profundas dimensões religiosas que acobertam a fé do seu povo, de tal modo que seja seguro passear ali e visitar todos os lugares com a mesma sensação de segurança e liberdade que encontramos em alguns países da Europa e da America Latina. Tendo passado por Londres e Paris, conforme estava no roteiro de minha viagem, cheguei a Tel-aviv na madrugada do dia 17 de setembro de 2014, às 00h33min. Depois, segui para Jerusalém aonde cheguei às 02h00. Uma mudança quase brusca de realidade geográfica e cultural, histórica e religiosa. Só o caminho do tempo para me revelar os mistérios e os segredos das aventuras que me aguardavam em terras tão distantes do meu inesquecível Brasil. 


De Paris para Jerusalém, acabei indo parar em Bucareste, na Romênia. Nunca pensei que um dia pudesse passar por lá. A empresa aérea Air France estava em greve, e muitos voos foram cancelados, inclusive, para o Brasil. A greve nada tinha a ver com Jerusalém ou Israel. Era um problema da dinâmica interna com alguns funcionários. No entanto, fomos muito bem atendidos. Meu medo era que não pudesse viajar logo. Viajar é muito bom, mas carregar bagagens para lá e para cá é muito desgastante. No aeroporto Charles De Gaulle, encontrei algumas freiras que estavam embarcando para os Estados Unidos. Fui cumprimentá-las, e a responsável me disse em espanhol: “Se o seu voo foi cancelado, padre, não se preocupe. Ficarei com o senhor e irei ajudá-lo. E, se não for viajar hoje, pode ir para nossa casa”. Era um bom sinal. Então, ela permaneceu comigo e me orientou durante todo o trajeto de remarcação da passagem. Graças a Deus, tudo foi resolvido a contento, não paguei excesso de bagagem por causa do cancelamento, e ainda ganhei dinheiro para “um lance” que a irmãzinha me presenteou. Peguei o voo de número 1588 da Air France para Bucareste, às 15h44, e de lá segui para Jerusalém no voo 153 da Tarom, uma empresa aérea local, da qual nunca tinha ouvido nem falar como também nunca havia escutado alguém falando romeno, uma língua neolatina, cujo vocabulário, vez por outra, faz saltarem algumas expressões tão compreensíveis como se fossem em português. Confesso que me despertou a curiosidade em aprofundar o conhecimento dessa língua. É a única das línguas neolatinas mais conhecidas da qual não sei nada.
Em Tel-aviv, tudo transcorreu na mais absoluta normalidade. Na alfândega, um lugar que sempre preocupa os turistas por causa do interrogatório, tudo tranquilo. No clichê por onde passei, havia um rapaz muito simpático e sempre sorridente. Quando chegou a minha vez, ele quis brincar dizendo que eu não tinha o visto necessário. “Como, não tenho? Ele está aí dentro, e, segundo, informações, eu terei um mês para me apresentar no Ministério do Exterior para convalidar o visto prolongando-o por um ano”. Depois, ele quis saber quanto tempo eu pretendia fica no país e me liberou. Deixou-me passar, entregando-me o papel no qual falava do tipo de visto, sem permissão para trabalho, e com a validade até o dia 17 de outubro, isto é, um mês. Tendo recuperando as bagagens, saí para pegar o transporte em direção a Jerusalém. Hoje, há uma organização de vãs, patrocinadas pelos judeus, que fazem o transporte de muitos turistas, cobrando um valor baixo e deixando cada um no seu próprio endereço. Um serviço eficiente e cômodo para todos que aqui chegam. No grupo que viajou comigo, havia uma brasileira com o seu pai. 

 

Se em Paris, eu me sentia em casa, mais em casa ainda, eu me senti desde que entrei no país de Jesus, a chamada “Terra Santa” – ‘admat raqqodesh, diz a expressão hebraica – como ficou conhecida na história. Como chegar aqui sem se lembrar das palavras comoventes de Cristo que chorou sobre Jerusalém: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os enviados de Deus, quantas vezes, eu quis agasalhar os teus filhos como a galinha acolhe os seus pintainhos debaixo de suas asas, e tu não me quiseste, e tu me rejeitaste!”? (Mt 23,37-39). A verdade é que essa palavra sempre volta quando nos permitimos colher os sentimentos de Cristo por nós mesmos, tão relutantes e rebeldes que somos quanto à aceitação de seu amor misericordioso. Quanta experiência bonita e marcante foi vivida nessa terra pelas pessoas escolhidas pelo Senhor durante todo o seu processo de autorrevelação. A Sagrada Escritura transborda, sobejamente, de exemplos edificantes de benções, mas também de provações pela dureza com que Deus tratou o seu povo e pessoas singulares, como no caso dos profetas, por causa da infidelidade. Um caso típico poderia ser tirado da vida do profeta Ezequiel, apenas enfatizando o exemplo, quando Deus lhe diz que tirará de diante dele a alegria de seus olhos, exigindo que ele não desse nem um pio: “Filho do homem, eis que, de um golpe tirarei de ti o desejo [a alegria] dos teus olhos, mas não lamentarás, nem chorarás, nem te correrão as lágrimas. Geme em silêncio, não faças luto por mortos; ata o teu turbante, e põe nos pés os teus sapatos, e não cubras os teus lábios, e não comas o pão dos homens. E falei ao povo pela manhã, e à tarde morreu minha mulher; e fiz pela manhã como me foi mandado” (Ez 24,15-17). Deus tirou de sua vida, a luminosidade da presença de sua esposa, que era o encanto de seus olhos. No entanto, o Senhor vê além da própria pessoa do profeta e projeta sua reflexão sobre o povo de Israel: “Assim diz o Senhor DEUS: Eis que eu profanarei o meu santuário, a glória da vossa força, o desejo dos vossos olhos, e o anelo das vossas almas; e vossos filhos e vossas filhas, que deixastes, cairão à espada. E fareis como eu fiz; não vos cobrireis os lábios, e não comereis o pão dos homens. E tereis nas cabeças os vossos turbantes, e os vossos sapatos nos pés; não lamentareis, nem chorareis, mas definhar-vos-eis nas vossas maldades, e gemereis uns com os outros. Assim vos servirá Ezequiel de sinal; conforme tudo quanto ele fez, fareis; quando isso suceder, sabereis que eu sou o Senhor DEUS” (Ez 24,21-24). 


Já pela manhã, encontrei uma brasileira que se hospedaria no Instituto Ratisbonne por duas semanas. Ela me levou para passear no primeiro dia de minha chegada. Saindo pela estrada, pedimos informações a um jovem judeu que passava sobre que direcionamento tomar na rua. Qualquer pessoa pela estrada fala inglês. Isso faz parte da cultura dos povos civilizados. Ninguém precisar ir a uma escola particular para aprender inglês. Pelo sotaque, o jovem quis saber de onde éramos. E ele concluiu: “Então, é melhor a gente falar em português mesmo!” Era um brasileiro que fora enviado pelos pais para estudar o hebraico moderno, a língua de sua família. Então, sendo que eu iria fazer o mesmo curso, quis saber como era, e ele me motivou dizendo: “É muito gratificando, mas o bagulho é tenso! Cada dia é um dia!”. Demos boas risadas, e fomos cada um para o seu lado. Todo curso intensivo é “tenso”, sobretudo, pela carga de exercícios e obrigações que impõem ao estudante o concentrar-se, trabalhando em casa com afinco e perseverança, no aprimoramento de qualquer língua estrangeira. Eu sei muito bem do que é que se trata porque foi essa a experiência que fiz durante dois meses na Alemanha, em Bonn, estudando a língua daquele país, em 2005. Não é fácil chegar em um país para aprender um idioma diferente do seu, ainda mais se ele tiver outro alfabeto, como é o caso do hebraico, que não é uma língua moderna, sem nenhum vocábulo da língua que mais livremente passeia pela inteligência do estudante, como o seu vernáculo. A batalha é dura, mas vencível. Só o fato do reconhecimento inicial dos códigos que compõem o texto da nova língua estudada já é uma grande alegria. É uma compensação. Assim que descobri por meio de um francês que veio estudar hebraico, aonde ir à missa numa comunidade cristã, comecei a frequentá-la. Tendo estudando o texto da celebração antes, pude segui-la sem dificuldades, embora, não estivesse em condições de ler com muita fluência. Mas já era um avanço. 

 

Curiosamente, quem celebrou a missa foi um padre do Instituto Bíblico de Jerusalém que conhecera em 2005, quando de minha primeira estada em Israel. Ele fora com os padres estudantes de Roma, que faziam estágio. Depois, por todos os lados, nos deparamos com frases e nomes nessa língua. Ela enche os olhos de novidade, e, aos poucos, o universo interior se transforma pela fonética musical ouvida pelas rádios e pela televisão. Há canais de desenho animado para crianças. Como elas falam com fluência, embora de modo mais vagaroso, isso ajuda o iniciante na conquista de suas novas descobertas. E, assim, motivados, seguiremos adiante!