quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Uma manjedoura cheia de graça!

Uma manjedoura cheia de graça 


Uma manjedoura cheia de graça! Também não poderia ser diferente. O cocho no qual é colocado o feno e o capim para alimentar os animais, tornou-se o lugar do pequeno menino nascido em Belém – em hebraico “Betlehem” que significa “casa do pão” – não para ser capim, mas alimento vivo que sacia a fome de eternidade que o homem carrega dentro de si pela vida afora. A saudade de Deus é preenchida somente por Deus. Daí a expressão de Santo Agostinho, logo no início, na primeira página de suas “Confissões”: “Fizeste-nos para ti, e inquieto está o nosso coração, enquanto não repousa em ti”. Por isso que ele veio ao nosso encontro, buscando-nos onde quer que nos encontremos perdidos no espaço físico, espiritual ou interior de nós mesmos. O sonho de Deus chega carregado de Si próprio na manifestação plena de sua extraordinária e frágil pequenez. Nasce como criança, vinda do seio de uma mulher, arrebentando os portões do mundo, com a grandeza de sua presença inaudita.
Hoje é Natal, dia da comemoração do nascimento de Cristo. Ele nasceu para todos! Para os ateus, que não conseguem aceitar a extravagância de seu amor incompreensível; para os agnósticos, que não afirmam a inexistência de Deus, mas preferem dizer: “Eu não creio que ele exista”, assumindo para si mesmos as consequências de sua descrença; para os arrogantes, que não conseguem ver além da suspeita de sua autossuficiência; para os materialistas, para os quais tudo termina no horizonte pobre e angustiante dessa terra; para os sábios, que, do pedestal de seu conhecimento, não percebem a grandeza da criação por trás da qual se esconde o seu Artista supremo; para os violentos, que, no arrojo de sua estupidez descontrolada, acumulam episódios que ferem e agridem a dignidade humana; para os pobres do mundo, que experimentam a marginalidade de seus direitos por conta da ganância dos poderosos; para os infelizes, que, na escuridão de sua noite interior, não conseguem vislumbrar a luz da realização de seus sonhos; para os incrédulos, visceralmente inimigos da possibilidade da existência de um Ser superior, que se debatem na incongruência de suas falsas crenças; para aflitos, que choram as limitações miseráveis de suas condições desumanas e insuficientes de seus desejos; enfim, ele nasceu para os espiritualmente dilacerados, pois somente sua plenitude humana pode curá-los.
Na manjedoura de Belém está a paz que o homem procura para as guerras; a harmonia para o caos cósmico e universal; a felicidade plena para os infelizes; o calor humano para os frios e indiferentes; a esperança viva para os desesperados; a serenidade para os inquietos e agitados; a salvação para os perdidos; a consolação para os sofredores; a calmaria interior para os injustiçados; a fortaleza para os fracos; a graça redentora para os pecadores; a cura definitiva para as feridas da alma; a vitória para o fracasso; a verdadeira vida para a morte; a coragem do amor sem limites para os indecisos. Na manjedoura repousa a esperança do mundo adormecido em sua insensibilidade doentia. Nela está a libertação de todos os opróbrios. Eis, pois, a grandeza desse menino, luz que ilumina as trevas de todos os povos, acobertando os séculos com sua luminosidade infinita: “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz, uma luz raiou para os que habitavam uma terra sombria. Multiplicaste o povo, deste-lhe grande alegria; eles alegram-se na tua presença como se alegram os ceifadores na ceifa, como regozijam os que repartem os despojos. Porque o jugo que pesava sobre eles, o bastão posto sobre os seus ombros, a vara do opressor, tu os despedaçaste como no dia de Madiã. Com efeito, todo calçado que pisa ruidosamente no chão, toda a veste que se revolve no sangue serão queimadas, serão devoradas pelo fogo. Porque um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, ele recebeu o poder sobre os seus ombros, e lhe foi dado este nome: Conselheiro-maravilhoso, Deus-forte, Pai-eterno, Príncipe da paz, para que se multiplique o poder, assegurando o estabelecimento de uma paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu reino, firmando-o, consolidando-o sobre o direito e sobre a justiça. Desde agora e para sempre, o amor ciumento de Iahweh dos Exércitos fará isso” (Is 9,1-6).
Na manjedoura de Belém está a plenitude de tudo o que Deus sonhou para nossa humanidade. Portanto, eis outra palavra do profeta Isaías: “Um ramo sairá do tronco de Jessé, um rebento brotará de suas raízes. Sobre ele repousará o espírito de Iahweh, espírito de sabedoria e de inteligência, espírito de conselho e fortaleza, espírito de conhecimento e de temor de Iahweh: no temor de Iahweh estará a sua inspiração. Ele não julgará segundo a aparência. Ele não dará sentença apenas por ouvir dizer. Antes, julgará os fracos com justiça, com equidade pronunciará sentença em favor dos pobres da terra. [...] Então o lobo morará com o cordeiro, e o leopardo se deitará com o cabrito. O bezerro, o leãozinho e o gordo novilho andarão juntos e um menino pequeno os guiará. A vaca e o urso pastarão juntos, juntas se deitarão as suas crias. O leão se alimentará de forragem como boi. A criança de peito poderá brincar junto à cova da áspide, a criança pequena porá a mão na cova da víbora. Ninguém fará o mal nem destruição nenhuma em todo o meu santo monte, porque a terra ficará cheia do conhecimento de Iahweh, como as águas recobrem o mar” (Is 11,1-9). A última expressão desse texto descortina e revela diante de nossos olhos extasiados de comoção natalina a profundidade que se levanta da manjedoura de Cristo para todos os povos. Desse modo, “a terra ficará cheia do conhecimento de Iahweh, como as águas recobrem o mar”. De fato, conhecer e reconhecer a Deus na fragilidade de uma criança é abrir as portas de nossa humanidade decaída pelo pecado às graças benditas do eterno Redentor.
Contemplando a manjedoura do menino-Deus, nascido em Belém, devemos recordar a bondade misericordiosa do Senhor que, do alto de sua Transcendência e inacessibilidade, chega ao nosso meio e se permite ser tocado pelas nossas feridas mais profundas. Mais do que isso: “Aquele que não conhecera o pecado, Deus o fez pecado por causa de nós, a fim de que, por ele, nos tornemos justiça de Deus” (2Cor 5,21). A estrela de Natal que brilha no horizonte de nossa existência não tem nada a ver conosco e, no entanto, veio na intenção de que sejamos restaurados nele. Ou seja: Cristo nasce para o mundo, a fim de que nós possamos nascer para os céus. Portanto, essa verdade fundamental da celebração do nascimento do Filho de Deus, Jesus Cristo, o Salvador, não deve ser esquecida ou obscurecida pela pressurosa busca das coisas fúteis que continuam deixando o coração vazio de tudo, ou cheio de tudo, menos, de Deus mesmo. Não deixemos passar em vão a extraordinária magia do Natal do Senhor, mas nos deixemos envolver profundamente pela grandeza de seu mistério, pela humildade de Deus que se rebaixa ao nível da nossa indignidade. Realmente, não somos dignos de Deus, mas, em Cristo, ele nos torna merecedores de todos os tesouros salvíficos de sua encarnação.
Ó pobre criança de Belém, teu nascimento enche de luz todos os caminhos dos homens e do mundo inteiro. Assumindo a nossa humanidade, tu nos revestes com a glória de tua divindade. Carregando em si todas as mazelas de nossos pecados, tu nos devolves a graça perdida no Paraíso. Espoliado de tudo, até de suas vestes, totalmente despido das riquezas humanas, que a ferrugem pode corroer, tu nos ensinas onde podemos encontrar a verdadeira dignidade, depois de todos os ultrajes sofridos pela injustiça dos homens. Tocando com tua humanidade todas as angústias do tempo e dos séculos, tu nos educas para a serenidade perene das consolações eternas. Enfim, chorando como todos os homens, tu nos mostras a compaixão divina por nossas fragilidades.
Muito obrigado Jesus porque, no teu Natal, tu continuas “nascendo no coração das pessoas de boa vontade, nos gestos de amor e partilha, nos povos que buscam a fraternidade e a paz”. A todos os meus queridos e estimados leitores, desejo-lhes um Santo e Feliz Natal, com Jesus no coração e na vida.