segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Perennitas Verbi Dei

Perennitas Verbi Dei 



Perennitas Verbi Dei

A palavra de Deus permanece para sempre. Por meio dela, nós somos orientados sobre as coisas do céu e os caminhos que nos levam na direção do alto, distante das coisas do chão, pelas quais nos sentimos tão atraídos e, até mesmo, desnorteados. Por que será que temos tanto medo de mergulhar nossa consciência nas páginas da Sagrada Escritura? Por que será que um texto, tão antigo e tão novo, não se perdeu no meio dos desvios comportamentais humanos, que, ao longo dos séculos, tem tentado varrer do espírito humano as verdades perenes da palavra de Deus [perenitas verbi Dei]? Por que será que não nos dispomos, com toda a capacidade de nossa liberdade interior, em saborear a Palavra de Deus, única palavra segura, que nos confere a certeza de um amor incondicional, não obstante todas as nossas resistências? 

Apesar das dificuldades que encontramos para ler e compreender os textos bíblicos, não devemos nem podemos desanimar. Com certeza, assim como a chuva fina cai no chão e fecunda a terra, do mesmo modo, também a palavra de Deus vai transformando o terreno do nosso coração e de nossa vida pela chuva fina de sua sabedoria divina, regando toda a nossa existência. Por isso, não nos deixemos levar pelas incompreensões aparentes. Lendo e rezando através dos textos bíblicos, sobretudo, pelo Novo Testamento, peçamos ao Senhor Jesus, que, assim como ele ensinou aos discípulos de Emaús (Lc 24), de igual modo, explique-nos as Escrituras e nos conceda o dom da fé e abertura aos seus ensinamentos, a fim de que possamos crer e viver a sua palavra. De fato, Jesus disse que não veio abolir a lei, mas levá-la à sua plenitude, dando-lhe sentido pleno a tudo aquilo que os profetas de Israel falaram da parte de Deus sobre o próprio Jesus. Na verdade, Cristo é a plenitude da Lei. Ele é a última Palavra revelada por Deus aos homens. Portanto, somente em sintonia com Cristo, seremos capazes de apresentar ao mundo, cada vez mais paganizado e anticristão, o testemunho sereno e autêntico de nossa adesão ao seu projeto de amor salvífico e redentor. Com efeito, a Palavra por excelência de Deus, Jesus Cristo, não é uma palavra estéril, ou incapaz de produzir os frutos devidos no seio da humanidade sedenta de Deus. 

Claro que a voz de Cristo e de sua Igreja poderia ser comparada à “voz que clama no deserto”, mas prepara os caminhos do Senhor. Sem Deus, o homem jamais atingirá o destino último de sua existência, qual seja, a transformação radical de seu ser e de todas as tristezas do mundo presente. Fechando-se para Deus, como se tem demonstrado o mundo ocidental, em que o sintoma da religião parece revestir-se de uma receita caseira e doméstica, ao sabor do cozinheiro e do cliente de sua cozinha, homem seguirá perdido, sem rumo nem direção certa. Impressionante como a onda dos antivalores tem grassado de maneira assustadora e veloz sobre as consciências menos advertidas. Os valores sagrados da dignidade humana não encontram mais o respaldo da coletividade desesperada, bordejando infrene, de uma direção à outra, pelo abismo do mais completo descalabro moral e espiritual. Essa semana, eu fui abordado por um grupo de jovens de uma Faculdade de Aracaju que distribuíam camisinha, indiscriminadamente, aos transeuntes do Shopping Rio Mar, como se todo mundo usasse ou devesse usar camisinha. Não seria um convite à depravação? Não seria uma forma disfarçada, mas, perniciosa de provocação à precocidade do desenvolvimento sexual de pessoas despreparadas para o respeito e a responsabilidade com o dom sublime da sexualidade, criada por Deus com uma finalidade específica e determinada pelas leis de sua própria natureza criacional? É verdade que não somos ingênuos a ponto de pensar que os “namoridos” modernos estejam privados das atrações fatais. No entanto, pensar que a educação sexual deva passar pelo incentivo à promiscuidade de todo tipo e sem o devido cuidado com o respeito pelo próprio corpo, tornando-o objeto da escravidão carnal de taras incontroláveis e ensandecidas, é um risco que precipita a todos na espiral maligna do redemoinho da depravação. Indubitavelmente, como há alguns anos afirmava o Papa Bento XVI em sua primeira viagem à África, o problema da AIDS e das doenças sexualmente transmissíveis não se resolve distribuindo preservativos. Depois, ainda querem combater a gravidez precoce e o abuso sexual dos pequenos, das crianças, instigadas por todo tipo de propaganda e publicidade, levadas pelos meios de comunicação aos adolescentes e jovens sob o prisma ideológico de educação. Na verdade, o que é a ideologia, numa palavra rápida e, talvez, superficial? A ideologia é uma ilusão social porque ela, não apenas esconde a realidade das coisas na sua verdade mais profunda, mas também mascara, dissimula, disfarça a podridão que o argumento falacioso oculta no primor de sua dialética perversa e contraditória. 

Contra essa avalanche de deturpação dos caminhos sinuosos da equivocada liberdade humana, está o pressuposto da palavra de Deus, que nos orienta sem ideologia nem demagogia. O contato frequente com a palavra de Deus alimenta o desejo de intimidade com ele por meio de uma vida de santidade. E os santos da Igreja de Cristo, durante todos os séculos, demonstraram que é possível uma vida virtuosa quando o desejo do coração é sincero. No entanto, essa sinceridade do coração não é apenas uma vontade distante dos caminhos de Deus, mas um empenho quotidiano na prática da vontade divina. Santa Terezinha do Menino Jesus dizia que bastava lançar o olhar sobre o Evangelho para, de modo imediato, respirar os perfumes da vida de Cristo, sabendo para onde correr nos momentos de sua aflição. Nesse sentido o Papa Bento XVI reconhece: “Certamente não é por acaso que as grandes espiritualidades, que marcaram a história da Igreja, nasceram de uma explícita referência à Sagrada Escritura. Penso, por exemplo, em Santo Antão Abade, que se decide ao ouvir a palavra de Cristo: ‘Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que possuíres, dá o dinheiro aos pobres, e terás um tesouro nos céus; depois, vem e segue-Me’ (Mt 19,21). Igualmente sugestivo, é São Basílio Magno, quando na sua obra Moralia, se interroga: ‘O que é próprio da fé? Certeza plena e segura da verdade das palavras inspiradas por Deus. [...] O que é próprio do fiel? Com tal certeza plena, conformar-se com o significado das palavras da Escritura, sem ousar tirar ou acrescentar seja o que for’” (Verbum Domini, n. 48). De fato, a Sagrada Escritura não é propriedade nossa ou de quem que quer seja, no sentido de que as partes menos cômodas ao nosso laxismo moral e ético possam ser rasgadas ou mesmo adulteradas. Eis, o fato pelo qual Cristo disse: “Até que passem o céu e a terra, não será omitido nem um só i, uma só vírgula da Lei, sem que tudo seja realizado” (Mt 5,17-19). 

O grande milagre que podemos constatar da palavra da Bíblia, é que ela não fica caduca, envelhecida, nem, para usar uma expressão da moda, perde o prazo de validade. O homem pode determinar uma moral segundo a conveniência de suas aptidões de vida errada; ele pode estabelecer critérios falsos pela votação da maioria, que, como já tive a oportunidade de afirmar, não é sinônimo de verdade; enfim, ele pode, inclusive, condicionar o oportunismo da realização de suas pretensões egoísticas e unilaterais, que satisfaçam todos os caprichos de suas vontades. Todavia, longe dos princípios divinos, ele terminará enroscado na teimosia incoerente de suas escolhas fatais e incongruentes ao estado de perfeição anelado pela inconsciência de suas carências mais profundas.