quarta-feira, 13 de julho de 2011

Boas Notícias...

Boas Notícias

Recentemente, o Santo Padre, o Papa Bento XVI, chamou a atenção da mídia internacional, que se expressa mediante o jornalismo de notícias, para o fato de que mais “boas notícias” deveriam ser levadas em conta pelas reportagens faladas ou escritas. Por que dar tanta ênfase às situações negativas, quando muitas coisas boas acontecem em redor do mundo, sem que ninguém fique sabendo? Penso que a preocupação do papa procede.
Há jornais que se forem espremidos, derramam sangue; outros vomitam violência, corrupção, imoralidade, desrespeito ao ser humano, indignação, covardia, intolerância, e por aí vai o caudal não eloquente de fatos e fotos da degradação da dignidade humana. Por que será que, na constituição da estampa social, os eventos negativos despertam tanta atenção e interesse? Quem verdadeiramente se alimenta do repasto podre e purulento do monturo da agressão ocular e auricular de tablóides, às vezes, tão agressivos? Quem são os clientes necrofágicos dessa pastelaria repugnante? Foi o Papa João Paulo II, hoje beato da Igreja de Cristo, quem disse que apesar de todo o mal que há no mundo, todo o bem nele existe ainda é maior. E nos esquecemos disso com muita facilidade. De fato, no garimpo de tanta banalidade jornalística, parece sobrar pouca coisa construtiva e edificante. Com efeito, nem sempre vamos aos títulos mais salutares, e procuramos destacar quem é o vilão da hora, qual a desgraça do momento ou quem está sendo vilipendiado por algum crime. A pouca luminosidade das boas notícias acaba sendo sufocada pela ampla cobertura do véu escuro das fatalidades do quotidiano.
No dia 5 de julho, visitando o “L’Osservatore Romano” – Jornal do Vaticano – por ocasião do seu sesquicentenário, o Papa Bento XVI confessava, com muito lucidez, o sentido profundo daquela “oficina”, que exigia muito mais criatividade humana do que trabalho técnico propriamente dito. E ele dizia que mais do que “fazer”, o jornal era dedicado, sobretudo, ao conhecimento, ao pensar, ao julgar, ao refletir. Ainda, mais do que uma “oficina”, era um “observatório”, como diz o nome, a fim de ver a realidade desse mundo e informar-nos a seu respeito. E o Papa continuava em seu raciocínio: “Parece-me que desse observatório podem ser vistas as situações distantes e vizinhas. Distantes, no duplo sentido: antes de tudo, distantes em todas as partes do mundo, como são as Filipinas, a Austrália, a América Latina; para mim, isso é uma das grandes vantagens do ‘L’osservatore’, que oferece realmente uma informação universal, que vê realmente o mundo inteiro e não somente uma parte”. Na visão do Papa, quase nenhum outro jornal no mundo consegue ver o cosmos na aldeia global, sem discriminar as regiões mais pobres ou menos importantes na sua dimensão geopolítica. Em segundo lugar, o Papa reconhece que do L’Osservatore as coisas distantes também são vistas em outro sentido: “L’Osservatore não permanece na superfície dos acontecimentos, mas vai às suas raízes. Além da superfície, mostra-nos as raízes culturais e o fundo das cosias. Para mim, não é somente um jornal, mas também uma revista cultural. Admiro como é possível, cada dia, oferecer grandes contributos que nos ajudam a entender melhor o ser humano, as raízes das quais vêm as coisas e como devem ser entendidas, realizadas, transformadas”.
As palavras do Papa são aparentemente simples, mas estão carregadas da força e da convicção de que é possível priorizar, de maneira mais criteriosa e construtiva, as notícias a serem transmitidas por outros jornais, que não o L’Osservatore Romano. E a lógica de seu raciocínio parece tão ingênua quanto luminosa: “Há outro fenômeno que me faz pensar e do qual eu sou grato, isto é, que ninguém pode informar sobre tudo. Mesmo os meios mais universalistas, por assim dizer, não podem dizer tudo: é impossível. É sempre necessária uma escolha, um discernimento. E, por isso, é decisivo na personificação dos fatos o critério da escolha: nunca existe o fato puro, há também uma escolha que determina que coisa aparece e que coisa não aparece. E sabemos bem que as escolhas das prioridades hoje, em muitos órgãos da opinião pública, com frequência, são muito discutíveis”. O Papa não deixa de ter razão. Quem já teve ou tem a oportunidade de acompanhar noticiários pelo mundo afora – inclusive vencendo a barreira das línguas – de modo especial, na era da comunicação cibernética, sabe que, como dizia o admirável professor e conferencista Dom Luciano Duarte, cada pessoa vê as coisas segundo o ângulo de seu interesse. E, talvez, seja essa a filosofia de pando de fundo que filtra as notícias de nossos jornais e telejornais. A depender das ideologias e dos interesses de condicionamentos de seus patrocinadores, muitas notícias importantes deixam de ser veiculadas pelas redes de comunicação de massa. Que o digam os países onde imperam a ditadura e a mordaça impostas pelo cinismo de seus caudilhos.
Penso que talvez, mais “boas novas”, mais “boas notícias” deveriam estampar as páginas de nossos jornais, mormente, favorecendo o crescimento do homem enquanto tal: sua cultura, sua educação, no sentido platônico – isto é, da filosofia de Platão, não em relação àquele contexto de um amor fictício e inalcançável, inatingível – a formação de seu caráter, de sua personalidade, da superação de seus conflitos pessoais e sociais. Mas, a quem será que interessariam produções jornalísticas desse tipo? Se, como diria o filósofo francês Blaise Pascal, a opinião é a rainha do mundo, pelo menos, fica a indicação de que elas podem melhorar, e muito, o universo em que vivem mergulhados os homens. Aliás, a propósito da “opinião”, eis o que afirmou o escritor italiano F. Filangieri: “Existe uma espécie de tribunal que se encontra em todas as nações; que é invisível, pois não tem nenhum dos sinais que poderiam manifestá-lo, mas age continuamente, e que é mais forte do que os juízes e as leis, do que os ministros e os reis; que podem ser corrompido pelas más leis; corrigido, dirigido, transformado em justo e virtuoso pelas boas leis; mas que não pode ser disputado e dominado nem pelas primeiras, nem pelas segundas. Esse tribunal... é o da opinião pública”. Eis, então, a tirania incontrolável das palavras impressas em folhetins de jornal e em tudo aquilo que, de uma maneira ou de outra, constitui o veículo, nem sempre saudável, da comunicação, que tanto ajuda a construir quanto a destruir a sociedade do “homo sapiens”. Depende muito de como deixamos envolver-nos pelo que lemos ou buscamos para saciar a sede da curiosidade nossa de cada dia.
Se “o homem não vive somente de pão”, e a palavra não deixa de ser um alimento substancialmente necessário à sobrevivência cultural de gerações inteiras, inclusive, da nossa própria geração, seria, não apenas conveniente, mas, urgentemente proveitoso, rever o tipo de leitura que vasculhamos, e com as quais perdemos tanto tempo em carimpagens infrutíferas de textos contraproducentes. E que ninguém pense que eu esteja falando, aqui, de censura, mas, de critérios pessoais, embalados pelo otimismo com que queremos edificar nosso homem interior. Assim como há pessoas negativas, que sugam nossas energias, a ponto de fazer-nos desfalecer, também há leituras que não acrescentam nada àquilo que somos na integridade sublime de nossa essência humana. De fato, eu prefiro debruçar-me sobre palavras seguras, que induzem à virtude, a ficar bordejando, à deriva, pelas águas agitadas de conteúdos vazios de proveitoso significado à própria vida, à própria existência.